Ah... a imbecilidade nacional!
«O cidadão estava visivelmente satisfeito e aliviado quando me abordou no café, de manhã: — Então, esteve no buzinão? — O buzinão, qual buzinão? Tinha-me esquecido dessa convocatória de indignação cívica, a juntar à paragem terrorista dos camionistas e a anteceder as marchas dos agricultores, dos taxistas e de todos os que querem 'gasóleo verde' — isto é, os cidadãos todos a pagar parte do seu gasóleo. — Pois eu estive! O cidadão olhou para mim, de cima a baixo, não conseguindo disfarçar a desilusão que eu lhe havia causado. — Ah... E buzinou contra quê? — perguntei maldosamente. — Contra quê? Contra o preço dos combustíveis,claro! — Pois, o preço dos combustíveis... E buzinaram contra quem: contra os produtores de petróleo, contra os especuladores internacionais, contra os chineses e os indianos? O homem olhou para mim como se o sol da manhã me tivesse feito mal à cabeça. — Ora essa! O buzinão era contra o Governo, e isto é só princípio! E virou-me as costas, orgulhoso da sua prestação cívica e da lição que me havia dado. Vi-o embarcar no seu carro com uma bandeirinha nacional flutuando à janela — sinal inequívoco de que ali estava um patriota de gema, que de manhã buzina contra o Governo, que não é capaz de inventar poços de petróleo, e o resto do dia buzina em apoio à nossa Selecção.»
Miguel Sousa Tavares, no Expresso desta Semana
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